talvez esse seja, até esse momento, um dos textos mais difíceis que sentei pra escrever, por muitos motivos. talvez porque decidi contar uma experiência pessoal, totalmente da minha perspectiva, parte da minha história. e a saída que eu criei pra isso. talvez porque isso tudo ainda esteja muito vivo em mim, no meio do caminho, sendo elaborado, sem conclusão ou algum tipo de final.
essa é a minha travessia. é no meio do rio, entre uma margem e outra, que me encontro.
então eu já aviso que, caso não faça sentido pra você, esse talvez seja um indício de que esses significados encontram rumo apenas dentro de mim. me perdoem, meus amados leitores - que ainda em maioria são meus fiéis amigos que me apoiam - mas essa news aqui nasceu pra isso. então vamos lá.
*respirando fundo antes de continuar sem saber por onde começar, risos*
houve um tempo, não muito tempo atrás, em que a vida, como quem grita implorando por ser ouvida, me despertou de uma ausência de mim mesma. adoecida pelas escolhas que pareciam mas não foram feitas por mim, aprendi primeiro que precisaria desistir.
parte de mim morreu no dia que cheguei em casa, depois de receber um diagnóstico. mais do que um quadro de saúde, eu tinha entendido que aquele também era um lembrete de que havia chegado a hora. só não sabia do que exatamente. sentia vontade de abrir espaço, me livrar de um tanto de coisa.
lembro de chegar em casa, sentar no chão do meu quarto e chorar por horas, me abraçando. talvez ali eu tenha finalmente reconhecido todo meu esforço pra chegar no lugar em que eu me encontrava, tenha percebido a exaustão no meu próprio corpo e o peso de alguma coisa que me impedia de sequer reconhecer minha voz.
naquele momento, ainda muito ferida e culpada, me perguntava sobre o que tinha me levado para aquele caminho. como caraleos eu tinha chegado naquele estado? mas entendi que isso faz parte das coisas que a gente só entende e descobre depois.
pode ser terrivelmente clichê - e vou me dar a liberdade de ser pra me lembrar que sou feita de muitas coisas comuns - mas eu precisei me perder pra poder me reencontrar. eu precisei me sentir completamente deslocada de mim, pra entender quem eu realmente queria ser e onde eu queria estar. eu precisei me sentir fora do controle pra me lembrar de quem nem tudo depende só de mim.
ou talvez seja apenas eu tentando encontrar algum tipo de sentido no meio desse mar de merda que me aconteceu. mas isso é a vida, né? quem leu meu primeiro texto sabe que a gente olha pra atrás e edita algumas coisas antes de seguir em frente.
mas o que importa é que, no meio disso tudo, quando você chega no fundo do poço, ou você fica mergulhado em martírio ou você aproveita que sua vida já está o puro suco do apocalipse e decide inventar uma saída. procura os interruptores em um corredor escuro. abre as janelas de um lugar mofado. claro que eu também tive muita gente do meu lado fez esse fundo virar mola e me jogar pra cima.
na expectativa de encontrar respostas para além do meu vazio, nessa época voltei a ler, a ouvir podcasts, cuidar da saúde meu corpo, comecei a fazer análise, a ter uma vida política mais ativa, validar meus interesses improdutivos e, não preciso nem dizer mas já dizendo, decidi escutar aquele desejo antigo de me formar astróloga e colocar minhas criações no mundo. voltei a escrever. me vi novamente artista, criadora.
até hoje é um pouco estranho me colocar nesse lugar que por tanto tempo foi deixado de lado. quando a gente vira adulto uma das coisas que a gente aprende é que de vez em quando é preciso dizer não, pra proteger seu espaço, sua própria integridade, aquilo que sustenta seu edifício. você não é mais uma criança que obedece sem questionar. é você andando de mãos dadas com a sua própria criança. tenho cuidado da minha.
no movimento contrário à solidão interna em que me encontrava, me vi parte de um coletivo, que compartilhava dores e alegrias parecidas com as minhas. desde então, tudo mudou dentro de mim. identifiquei os papéis que assumi sem perceber. me absolvi do sentimento de culpa, dessa vez havia entendido a origem dos meus sofrimentos, ou melhor, o que havia me levado a habitar aquele lugar.
de repente senti uma vontade imensa de compartilhar essas descobertas com o mundo. ainda engatinhando, sem saber quais palavras usar ou até mesmo o que exatamente eu queria dizer, nasceu o observatório coletivo (se quiser pode clicar pra ver o primeiro vídeo que postei, vai ser um ótimo complemento e ponto de partida para esse texto).
o processo da individuação natural produz uma consciência do que seja a comunidade humana, porque traz justamente à consciência o inconsciente, que é o que une todos os homens e é comum a todos os homens. a individuação é o ‘tornar-se um’ consigo mesmo, e ao mesmo tempo com a humanidade toda, em que também nos incluímos.
jung
esse foi o marco de quando abri a primeira porta pra me verem - e eu me incluo nesse todo - de outra forma. lembro de gestar o observatório por quase 6 meses antes de fazer ele nascer. tanta coisa saiu debaixo do tapete pra isso acontecer.
percebi o quanto era dura e exigente comigo, o que se escondia por trás do meu perfeccionismo, do meu medo de não ser compreendida, de não fazer sentido, de falar algo que ferisse alguma realidade diferente da minha. eu também me achava no dever de contemplar a vivência de todas as pessoas.
mas o que fui percebendo no meio do caminho é que estava novamente me esvaziando da minha própria subjetividade, aquilo que caracteriza a minha própria voz, me vi longe do meu lado humano e falho, enrijecida e - a pior coisa que uma escorpiana pode achar de si mesma - superficial.
afinal, eu precisava ser genérica e abrangente para falar o que gostaria de falar e do jeito que eu achava que precisava falar, dentro das regras que eu mesma me colocava, mas também tomada pela dinâmica e pelo medo que a exposição nas redes sociais nos faz performar.
como eu, que buscava narrar minha própria história, poderia aprender a falar sem antes me ouvir? 1 ano depois, precisei silenciar. buscar outro tempo, outro ritmo, outra forma. não voltei do carnaval a mesma.
como uma pessoa de sol na casa 7 e saturno na 11, tenho plena consciência de que a formação da nossa individualidade é composta também pela troca que temos com os outros, tantas vezes espelhos nossos, que é preciso ter responsabilidade com a nossa participação no coletivo e, por isso mesmo, também com quem somos, nosso próprio eu, e como somos atravessados e afetados por esse externo.
uma comunidade não pode florescer em uma vida dividida. muito antes de uma comunidade assumir uma forma e uma aparência externas, ela deve estar presente como uma semente num self íntegro: apenas se estivermos em comunhão com nós mesmos poderemos encontrar a comunidade com os outros.
parker palmer, citado pela bell hooks
esse sempre foi um ouroboros pra mim, se é que posso chamar assim, mas é a imagem que me veio à cabeça (símbolos do meu imaginário rs). a cobra que come a própria cauda, onde tudo começa e também onde tudo termina e vice versa. (o pedro já me fez perder as contas de quantas vezes passamos horas e horas falando sobre esse assunto sentados na sala de casa, ou em qualquer outro lugar. talvez ele nunca tenha fim, talvez eu até deseje que não pois isso me intriga e me move a querer saber mais).
é preciso coletivizar nossas questões, sim. assim como também é preciso ter espaço para ser. coletivizar não é padronizar pra otimizar, aprendi. a vida não é útil. e certamente é muito mais complexa do que isso. coletivizar é quando todos podemos existir enquanto indivíduos, ser em conjunto.
a leitura me ajudou a perceber o que existe nas entrelinhas de uma trajetória pessoal. quando falo da leitura, não digo sobre ler um livro ou um texto em si, mas sim sobre sermos leitores na nossa própria vida. talvez o observatório seja esse leitor dentro de mim. pensei nisso um dia que minhas amigas foram em casa e, contando suas próprias histórias, nos conectamos e percebemos tantas coisas conjuntas. ler me motiva e me inspira a escrever. e aqui também tô falando da vida, se é que preciso reforçar. me sinto mais viva. o externo desperta o interno. o interno desperta o externo. disso surge a direção.
sempre aconselho as pessoas a falarem sobre as suas questões. pois assim percebem que valor de fato as coisas têm para elas. (…) podemos ter qualquer tipo de vivência; mas, se passarmos por ela sozinhos, então é como se não tivéssemos de fato nos dado conta. é preciso que a dividamos com alguém, assim teremos a possibilidade de tomar consciência de forma plena. e somente então somos capazes de perceber o que certas vivências significam para nós em termos de sentimentos.
jung
decidi começar a escrever esse texto pois tenho convivido com o sentimento e o pensamento de não me posicionar mais como observatório coletivo, apesar de amar o nome e a ideia, que seguiriam vivos de algum jeito. a princípio parece ser uma decisão simples e de zero impacto, e na prática realmente é. mas acho que esse incômodo surgiu dentro de mim a partir do momento que comecei a escrever aqui, quando ser apenas julia me pareceu suficiente.
percebi que na minha mochila só posso carregar a mim. o que não significa que nessa jornada não estarei acompanhada de outros, que também tem sua própria bagagem. que talvez a gente esteja mirando o mesmo horizonte, pegando a mesma estrada. ou que de vez em quando a gente precise revezar as mochilas, mesmo que de forma temporária, só pra ver como é. pra um subir uma escada, pra desviar de um buraco.
é no meu corpo que ela estará quando eu precisar abrir a mata com um facão contando pros outros que dá pra passar, pra mostrar que ali também é caminho. ou pra pisar na estrada que alguém já asfaltou. mas é a minha mochila que começa e termina comigo. ela não é única, mas é a única que tem a mim.
deve ser essa a nova fase que vivo por aqui, enquanto escrevo. como prometido termino esse texto sem conclusão alguma, mas me parece que eu já tenho uma resposta para esse grande (contém ironia) dilema. como é gostoso dar atenção para as minhas próprias questões, por vezes tão simples, tão discretas. os mitos que me operam - ou operavam. emaranhados que pulsam e que escondem em si nosso jeito de andar e para onde vamos.
quanto mais nos aceitamos, mais estamos preparados para assumir responsabilidades em todas as áreas da nossa vida.
ao comentar esse terceiro pilar da autoestima, Branden define a autorresponsabilidade como a disposição de “assumir a responsabilidade pelas minhas ações e a realização dos meus objetivos, (…) pela minha vida e pelo meu bem-estar”.
assumir a responsabilidade não significa negar a realidade da injustiça institucionalizada. (…) no entanto, podemos escolher como reagimos aos atos de injustiça.
assumir a responsabilidade significa que, diante de barreiras, ainda temos a capacidade de inventar nossa vida, de moldar nosso destino de formas que ampliem nosso bem-estar ao máximo.
todos os dias praticamos essa transmutação para lidar com realidades que não podemos mudar facilmente.
bell hooks
esse texto também é um oferecimento ao meu retorno de saturno, que acaba esse mês, quando entrar em áries. sobrevivemos ao senhor do tempo - com muito trabalho interno como bem pede sua morada em peixes, no meu mapa - e essa é uma mensagem encapsulada para a próxima visita.
ps: relendo esse texto 1 dia após ser escrito, tenho claro que esse retorno me trouxe de volta pra mim.
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também estou (ainda??? rsrsrs) como @observatorio.coletivo no instagram caso queira me acompanhar por lá! sempre aviso nos stories quando a próxima news estiver pra sair.
✹ MOVIMENTOS ASTRAIS / um outro tempo
céu de maio*
SEMANA 1-04/05
02/05 14:06 vênus conjunção netuno áries
✴ 04/05 12:27 início plutão retrógrado aquário
SEMANA 5-11/05
05/05 14:21 mercúrio áries sextil júpiter áries
06/05 18:31 vênus áries sextil plutão aquário
✴ 10/05 09:15 mercúrio entra em touro
SEMANA 12-18/05
✴ 12/05 13:55 lua cheia escorpião 22°12’
⚠︎ 12/05 14:22 mercúrio touro quadratura plutão aquário
17/05 20:32 sol touro conjunção urano touro
⚠︎ 18/05 01:35 mercúrio touro quadratura marte leão
SEMANA 19-25/05
20/05 06:38 sol touro sextil saturno peixes
✴ 20/05 15:55 sol entra em gêmeos
22/05 04:41 vênus áries trígono marte leão
22/05 09:39 sol gêmeos sextil netuno áries
24/05 12:55 sol gêmeos trígono plutão aquário
24/05 20:14 mercúrio touro conjunção urano touro
✴ 25/05 00:36 saturno entra em áries
✴ 25/05 22:00 mercúrio entra em gêmeos
25/05 22:45 mercúrio gêmeos sextil saturno áries
SEMANA 26-31/05
26/05 17:36 mercúrio gêmeos sextil netuno áries
✴ 27/05 00:02 lua nova gêmeos 06°05’
27/05 14:55 mercúrio gêmeos trígono plutão aquário
30/05 01:12 sol gêmeos conjunção mercúrio gêmeos
*horário de brasília.
_inspirações dessa edição
*descobri um podcast delicinha sobre literatura, cultura e otras cositas más: é tempo de morangos da @brunamartiolli
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